Zanatta
Histórias do Futebol. No final da década de setenta dois
jogadores do bairro do Ipiranga, em São Paulo, faziam parte das categorias de
base do SAAD, hoje conhecido por São Caetano, porém, mal sabiam o que o destino
reservava para ambos.
Gilberto
Anastácio de Farias, o meio campista Zanatta, apelido que recebeu dos
jornalistas Eli Coimbra e Roberto Petri por parecer com o ex-meia do Vasco e do
Flamengo, começou a carreira no dente de leite do General Motors FC, em 1972. E
já nos juniores do São Caetano foi promovido para o time profissional, tendo
assinado um contrato de gaveta, algo normal naquela época. E seu amigo, Rui
Ramos, um zagueiro que mais tarde se tornou meia, tinha estourado a idade e não
subiu para o profissional e acabou dispensado.
Naquele
período, um brasileiro de descendência japonesa, Jorge Yanashiro, foi para o
Japão trabalhar em um jornal e também jogar no time desta empresa. Após dois
anos voltou ao Brasil com a missão de levar mais dois brasileiros. O irmão de
Rui Ramos, Carlos Nicotra, conhecido pelo apelido de ‘‘Ganso’’, foi convidado e
o outro escolhido foi o garoto Zanatta. A reunião onde se definiu pela escolha
dos dois foi num bar na Vila Anae, no Ipiranga. Dois contratos na mesa. Zanatta
e Ramos não estavam presentes.
Primeiro
Zanatta ao ser comunicado aceitou, mas depois voltou atrás.
‘‘A
história de que não fui jogar no Japão por impedimento de mãe ou namorada nunca
existiu, eu já tinha me tornado um profissional no SAAD, então transferi o meu
convite ao Ramos e ele aceitou, só isso, essa é a mais pura verdade. Para mim
não era interessante porque no Japão o futebol praticamente inexistia em 1975. Eles
foram trabalhar e jogar pelo Yomiuri, o jornal de maior circulação do Japão na
época, para ganhar algo em torno de 1.500 dólares por mês e disputar um campeonato
aos moldes do campeonato da terceira divisão amadora de Atibaia. Eu já ganhava
no SAAD algo em torno de três salários mínimos, significante na época e me dava
status de profissional. E foram para o Japão. Passaram muita dificuldade, o
Ramos quebrou a perna, a gente se falava por carta e ele contava os momentos
difíceis que atravessou’’, explica Zanatta.
Rui Ramos
Ruy
Gonçalves Ramos Sobrinho, um brasileiro do Rio de Janeiro que se naturalizou
japonês em 1989. Foi um dos primeiros jogadores estrangeiros no futebol
profissional japonês, pelo Yomiuri, mais tarde se tornou o Verdy Kawasaki e
hoje é o Tokyo Verdi. Foi membro importante da equipe nacional japonesa de 1990
a 1995 e na mal sucedida campanha nas eliminatórias para a Copa do Mundo de 94.
‘‘O jogo de sua vida foi diante da Arábia Saudita nas eliminatórias asiáticas
para a Copa dos Estados Unidos, o Japão ficou por um gol de se classificar’’,
disse Zanatta.
Como
jogador foi artilheiro da Japão Soccer League em 1979 e 1983 e melhor jogador
do Ano em 1990 e 1991. Ramos se aposentou em 1998, com 41 anos de idade.
Também
foi consultor técnico e conselheiro, e tornou-se treinador do Japão no futebol
de praia. Depois foi nomeado técnico do Tokyo Verdy. Mais tarde se tornou diretor
executivo do clube.
‘‘Tinha
uma técnica refinada, conheci ele como zagueiro aos moldes do Dário Pereira,
mas era eclético e passou para a meia esquerda. Tinha bom domínio de bola, os
fundamentos e a qualidade do jogador brasileiro. Essa técnica foi valorizada no
Japão. Era um grande amigo, de muito caráter’’, cita Zanatta.
‘‘O
Rui jogava muito, era zagueiro e em qualquer lugar que o colocasse jogava,
depois que passou a jogar no meio lá no Japão. O Zanatta era uma volante
maestro, jogava demais. O que prejudicou é que ele foi para o São Caetano e o
colocaram na lateral direita para escalar o Toninho Vieira no meio’’,
recorda-se Suzete de Oliveira, o Baiano Barbeiro, ex-técnico do Santo Antônio,
time amador do bairro do Maracanã, em Atibaia, no interior de São Paulo, onde
os jogadores também atuaram.
No
SAAD, Zanatta conquistou muitos títulos regionais e lá ficou até 1981, quando
se transferiu para o Santo André. Em 81, devido as boas apresentações em seu
clube, Zanatta defendeu a Seleção Paulista que representou o Brasil no Torneio
do Rei da Malásia. “Eu era o capitão e tinha como companheiros o Wilson
Gottardo, o Tuíco, ex-Santos, e o Barbosa, ex-Palmeiras. Passamos na Ásia
jogando contra Japão, índia, Indonésia, Iraque, Coréia, Malásia, Austrália,
Nova Zelândia, entre outros”, se lembra.
Zanatta
também jogou na Francana, Santo André e Remo, atualmente mora em Atibaia. Em
2005, esteve no Japão como treinador de futebol para crianças de 10 a 12 anos,
no Requios FC, time amador de Okinawa.
Em
1982 foi para a Francana, de Franca no interior de São Paulo. E participou da
vitória do time interiorano contra o Corinthians, válido pelo segundo turno do
Paulistão daquele ano, mais tarde o Timão foi o campeão após bater o São Paulo
por 3 a 1, no Morumbi. A partida aconteceu no estádio Lanchão, em Franca e o
árbitro era Romualdo Arppi Filho.
Zanatta
ainda defendeu o Remo (1983), Bragantino (1983), Palmeiras de São João da Boa
Vista (SP - 1984), voltou ao Santo André em 1985, Capivariano de Capivari (SP -
1985/86), Guaçuano de Mogi-Guaçu (SP- 1986), União FC de Mogi das Cruzes
(1987), EC Dom Bosco de Cuiabá (MT - 1988) e o Grêmio Atibaiense, de Atibaia
(SP - 1989), onde encerrou a carreira após contusão séria no ligamento cruzado
anterior do joelho, teve que colocar dois “pinos” no local.
‘‘Minha
carreira valeu, a gente vai mudando os valores da vida. Acredito muito em Deus,
o que faltou foi a oportunidade na hora certa, mas eu era muito feliz jogando e
não importava se eu estava no Bragantino ou no Flamengo. O importante era estar
disputando. Me arrependo de não dar continuidade, de me preparar para ser
treinador’’, desabafa Zanatta.
A cidade de Atibaia, onde Zanatta mora
atualmente, surgiu na vida dos dois boleiros devido a eles, antes da
profissionalização, jogarem no Black Power, time amador do Ipiranga, na capital
e o compadre de Zantta, o já falecido ‘‘Borção’’, via os jogos por trabalhar em
São Paulo e os trouxe para o Santo Antônio.
Black Power/SP Zanatta (Segundo em pé da esquerda pra direita). Rui Ramos, o segundo agachado E/D.
O técnico Baiano explicou por que eles
pararam de jogar em seu time:
‘‘o
Zanatta eu não quis mais em oitenta, por que ele era profissional no SAAD e
vinha para cá e tinha gente que entregava ele no São Caetano, falava que o
Zanatta tava jogando muito em Atibaia. Agora o Rui tinha ido para o Japão’’.
Ex-técnico Baiano Barbeiro
Baiano
se lembra de um fato interessante quando Rui Ramos veio passear no Brasil em
1980: ‘‘nós fizemos a final do Campeonato Municipal de Atibaia contra o Grêmio
Atibaiense, ele veio passear e queria jogar. Não deixei com medo de punição.
Perdemos de dois a zero, eu devia ter escalado o Rui e pelo menos garantir a
foto com ele’’.
Quanto
à decisão de Rui Ramos ter ido para o Japão, Baiano comentou: ‘‘foi a melhor
coisa que ele fez, deu tudo certo, ele era bom e chegou à Seleção Japonesa com
mérito. Acho que se o Zanatta fosse pro Japão ficaria famoso igual ao Rui, mas
ele era profissional e indo pro Japão teria que jogar no amador. Na época ele
tomou a decisão certa. O Japão cresceu depois’’, finaliza o ex-técnico.
Zanatta
fala se arrependeu de não ter ido para o Japão: ‘‘se eu soubesse o que iria
acontecer no Japão eu iria, mas o futebol era aqui no Brasil, naquela época no
Japão não tinha nada, não era pra mim. Não tem como se arrepender’’.
E
se tivesse aceito o convite o ex-jogador comenta se teria conquistado o mesmo
sucesso de Ramos: ‘‘seria semelhante, tudo o que ele fez que cativou o japonês,
como o futebol alegria, eu já fazia aqui. O samba, o drible, a jogada plástica.
Profissionalmente seria similar. Mas o diferente é o carisma dele que é bem
maior e hoje ele é o que é no Japão’’, refere-se sobre a celebridade que Rui
Ramos se tornou na Terra do Sol Nascente, dono de restaurante e trabalhando em
emissora de televisão.
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